O Ituano Clube funcionou durante décadas no Centro de Itu, fazendo parte da história de vida de muito ituanos e da cidade. Ficou conhecido por suas festas impecáveis e hoje, fechado, o que restou foram lembranças de um tempo que há muito se foi
O Ituano Clube está na lembrança de muitos ituanos e é de grande importância não só para os cidadãos, mas para a história da cidade. Ao adentrar as portas nos dias de hoje, já não encontramos mais o lustre do saguão iluminado, o tapete vermelho escadaria acima e muito menos os espelhos nas paredes de ambos os lados. O que vemos é muito pó, umidade e um lugar que há muito não é usado. O atual presidente Marco Antonio Marques de Almeida, o Maca, afirma que ainda não abandonou o sonho de ver o clube funcionando novamente, mas para isso, esforços e muitos investimentos terão de ser feitos.
O Ituano Clube teve início há quase 90 anos, em 15 de novembro de 1923, com um grupo de amigos, entre eles Júlio Cezar Pimenta e Gustavo Cortez que se reuniam para jogar cartas. No começo funcionava em um imóvel alugado na praça Padre Miguel (da Matriz). Visando a construção de uma sede própria fundou-se a Sociedade Progresso e Melhoramentos de Itu para arrecadar fundos. O comendador Magalhães, Vitorino José de Souza Magalhães, industrial do Rio de Janeiro, frequentava Itu, pois na época namorava Nilza Gomes, filha do empresário ituano Alberto Gomes, com quem se casou posteriormente. Assim, um dia no clube, o comendador Magalhães junto de outros empresários presentes, deu início ao sonho de construir a sede. “Ele sempre estava presente no clube e foi quem abriu o Livro de Ouro, fez a introdução e começou com 200 contos de réis em cotas do clube. Os outros empresários ali presentes colocaram mais cotas, e a Sociedade com 160 cotas, assim chegaram a 870 contos de réis”, conta Maca.
O terreno no Largo da Matriz já havia sido comprado e então as obras da sede começaram. O responsável foi o engenheiro Pérsio Pereira Mendes, presidente da Sociedade Construtora Celbe Ltda. Na época, o Ituano Clube foi construído com o que havia de mais moderno em construção civil. A inauguração do prédio aconteceu em 05 de julho de 1947, e contou com a presença do então governador do Estado, Adhemar de Barros, que foi recebido pelo presidente do clube Vicente Gomes. “Na época tornaram-se diretores do clube os que mais contribuíram”, ressalta Maca.
Em sua essência o Ituano Clube era um local de carteado, e permaneceu assim da década de 40 até final de 70. “Eu lembro que minha bisavó ia a missa na Igreja da Matriz e depois já parava no Ituano para jogar. A minha avó me levava com ela no Ituano aos sábados e domingos. Nós chegávamos ao clube às 2h da tarde e saíamos 2h da manhã. Ela ficava esse tempo todo jogando. Eles ficavam tanto tempo jogando, que mandavam vir comida do Bar do Alemão ou do Richards, porque não levantavam da mesa de jogo por nada. Era fantástico”, relembra a atual secretária de Cultura de Itu, Allie Marie Queiroz.
O Ituano Clube era frequentado apenas por seus sócios durante as décadas de 50, 60, 70 e meados de 80, e chegou a ter mais de 2.500 associados pagantes que utilizavam da estrutura do local como salas de carteado, salão e festas, biblioteca e dois cafés por noite, que eram servidos às 19h30 e 23h. “O clube funcionava apenas para sócios, mas você podia ser convidado, por um sócio, em alguns eventos apenas por duas vezes, e depois disso você era bem-vindo a se associar, se morasse em Itu”, esclarece o atual presidente.
Com o tempo algumas festas começaram a acontecer como o aniversário do clube, Réveillon, Baile do Havaí e o famoso e inesquecível Carnaval. Para a folia de Momo, o prédio era inteiramente decorado e todos os sócios aproveitavam a festa. A ituana Kátia Temporim ganhou o título de sócia do Ituano de presente quando completou 17 anos e sempre recorda, com carinho, da época que frequentava o local. “Eu fiquei sócia em 1988, adorava o clube. Para nós, que éramos sócios, era uma segunda casa”, conta e acrescenta. “Todos os eventos do Ituano eram muito esperados, mas para mim, o Baile do Havaí marcou muito”. Devido à grande procura pelo clube, alguns eventos foram inseridos no estatuto e depois do Carnaval, o Baile do Havaí se tornou o mais frequentado.
O Ituano Clube não só era conhecido em Itu, mas em todo o Estado de São Paulo. Vinham pessoas de todos os lugares para conhecê-lo, entre elas muitos ilustres. “Eu fui presidente do clube pela primeira vez quando tinha apenas 22 anos. Lembro-me muito de Tarcísio Meira, Glória Menezes, Anselmo Duarte, Simplício, Paulo Maluf e muitos governadores do Estado, principalmente no Carnaval”, destaca Maca.
O início dos anos 90, com o surgimento de boates, o Ituano Clube, talvez por tentar acompanhar a moda ou talvez por uma diretoria que não entendesse a verdadeira essência do clube, acabou se perdendo ao tentar acompanhar o ritmo de uma casa noturna. Um dos filhos do humorista Simplício, Eduardo Almeida, lembra quando frequentava o clube com o pai. “Eu comecei a frequentar o Ituano como dependente do meu pai. Quando fiz 18 anos, em 1982, me associei. Era o melhor clube do Interior, glamoroso e o mais legal era a união das pessoas. Lembro-me de ir todos os dias no clube, jogávamos tênis de mesa, snooker, truco, era muito bom”, recorda-se e acrescenta que o clube deixou de ser o que era. “Não lembro quando deixamos de frequentá-lo exatamente, mas lembro-me de que o clube foi ficando diferente”, encerra.
O Ituano deixou de ser frequentado apenas por sócios e passou a ter uma portaria, assim qualquer um que comprasse o ingresso tinha acesso ao local. “Acredito que foi uma sucessão de erros. O Ituano chegou a ter a maior sala de carteado do Interior paulista, mas acabou perdendo a sua essência. Ele era um segundo lar para os sócios, que se sentiam à vontade nele, mas a partir do momento em que abriu portaria, os sócios já não eram mais a prioridade do clube. O Ituano Clube sempre privilegiou seus sócios e se tivesse continuado, talvez eles não tivessem deixado o local”, justifica o atual presidente.
Todos os sócios deixaram o clube, restando apenas os remidos e suas famílias, somando pouco mais de cem pessoas. O último evento do Ituano Clube aconteceu em 2006 e desde então o local permanece fechado.
De volta à ativa
Nos dias de hoje, o Ituano Clube está sob os cuidados do presidente Marco Antonio Marques de Almeida, o Maca, e o imóvel pertence aos cotistas. Segundo ele, a resposta para o clube não é o poder público. “Eu acredito que o Ituano precisa de alguns empresários que tenham história com o clube ou um grupo de pessoas, pelo menos para colaborarem nesse primeiro momento. Existem muitas ideias para o uso do prédio, mas para isso uma reforma precisa ser feita. Desde que a atual diretoria assumiu, há seis anos, apenas pagamos dívidas e vamos corrigindo as ações do tempo para que nada de pior aconteça ao edifício”, explica o presidente.
O prédio de 2.400m² encontra-se fechado há sete anos na praça da Matriz, sem uso, e com mínimos cuidados. O local recebeu gerações de famílias ituanas e sempre vai fazer parte da história da cidade e de muitos cidadãos, que ali, se divertiram, namoraram e até mesmo encontraram seus maridos e esposas. Mas há alguns anos que o local vem pedindo ajuda e de certa forma, agonizando, no Centro histórico de Itu. Um prédio suntuoso, frequentado por pessoas ilustres em eventos inesquecíveis e que abriga tanta história, merece ter esse destino?
texto Gisele Scaravelli
fotos Acervo do Museu Republicano e Reprodução