Estreando em horário nobre como protagonista – em “Terra e Paixão” -, Barbara Reis vive seu melhor momento. Além da TV aberta, como a mocinha Aline, ela também está em “Todas as Flores”, novela em exibição no streaming (Globoplay), em que interpreta a vilã Débora. Nome promissor da dramaturgia brasileira, Barbara não é um rosto tão novo assim, já que atuou em diversas novelas e séries antes de conquistar o destaque atual. Com o apoio da família, especialmente da irmã, que também fazia aulas de teatro, o incentivo foi fundamental para a atriz continuar em busca de seu sonho: viver da arte de interpretar, mas sempre com os pés no chão. “Não me deslumbro com o que o ofício traz como benefício”, diz ela em entrevista exclusiva à Regional. Barbara fala sobre suas conquistas, o sucesso de suas personagens nas duas novelas em exibição e seus projetos futuros.
REVISTA REGIONAL: Como surgiu o convite para participar de “Terra e Paixão”?
BARBARA REIS: Foi através de teste. Quando o produtor de elenco me ligou, nem acreditei que seria um teste para a protagonista. Demorou para cair a ficha. Eu me preparei e fui. Senti que naquele dia estava potente, preparada, e sai muito confiante.
Com o protagonismo numa novela de Walcyr Carrasco vem grandes responsabilidades. De que maneira você trabalha a ansiedade e o ego para que as coisas não fujam ao seu controle?
Eu sempre fui uma mulher de pés no chão, sempre lembro de quem sou e de onde eu venho. Sou uma pessoa tranquila. Geralmente, a expectativa das pessoas sobre determinada coisa é até maior que a nossa própria expectativa. Eu foco muito no que preciso fazer, trabalhar é o meu ofício e é diário. Não me deslumbro com o que o ofício traz como benefício. Como o nome diz, é benefício. Um dia, inclusive, esse benefício pode até não existir mais. Eu estou extremamente feliz e segura. Eu me sinto preparada, com meus pés no chão. Cheguei até aqui através de muito trabalho, foco, determinação e esperança. Mas sigo vivendo um dia após o outro e lembrando sempre de quem sou. É uma realização não só minha como da minha família, da minha mãe, de amigos que me acompanham desde criança fazendo teatro. Estou muito feliz!
Como estão as expectativas para este trabalho e como você acha que o público está recebendo a sua personagem?
Como em todo trabalho, vivo um dia de cada vez. Mas não posso negar que esse é o de maior relevância até hoje, e que carrego uma enorme expectativa no meu coração. Mas a Aline que vou entregar é uma mulher de verdade, simples, com sua vaidade, reta, sonhadora, e que tem a esperança como a fagulha de continuar a viver. Uma mulher que luta pelo seu objetivo, humana, e que vive as suas vontades.
Sobre a sua personagem de “Terra e Paixão”, em quem você se inspirou para interpretá-la e como você se preparou? O que a Aline traz de novo e de desafiador para você?
Aline é como eu. Estamos em momentos parecidos, excluindo a parte trágica. A preparação ficou muito para o ‘ao vivo’, para o momento que cheguei ao Mato Grosso do Sul para as primeiras cenas. Quando pisei na terra, eu entendi quem era a Aline. Fora isso, foquei em aprender o sotaque, neutralizar o meu e colocar o erre sutil da região. Sobre o que ela traz de novo é o contexto rural que, para mim, é uma novidade. Ouvi muitos podcasts de tecnologia e inovação sobre esse universo. O desafio é contar essa história juntando tudo o que ouvi sobre o assunto e torná-lo natural nessa jornada.
E como estão as gravações, o convívio com o elenco, o que você destaca que está sendo mais interessante nesse começo do trabalho?
Todo trabalho que começa com uma viagem já une toda a equipe. O clima não poderia ser melhor. Estamos empolgados e com amor nos olhos. O mais interessante, para mim, foi perceber a grandiosidade que é o “mar do soja” e como ela se transforma no decorrer dos dias: verde vender, depois amarela, e depois seca. Um ambiente mutável.
A Aline é uma mulher potente, feminista, eu diria, que não se deixa intimidar pelo poderio masculino da trama. Na sua visão, qual a importância da representatividade da sua personagem para as mulheres, especialmente pretas?
Primeiro a importância de um protagonismo negro numa novela das nove. E mostrar a força da Aline é mostrar a força das mulheres negras, mas não só uma força de que apenas somos fortes e resistimos, mas uma força humanizada, uma força que também sofre, uma força que tem fragilidade. E não só a mulher negra guerreira. Mas uma mulher negra plena em sua dimensão humana, múltipla, que tem fragilidades, sonhos, sutilezas e leveza.
“Existe um problema de gênero e temos que resolvê-lo, temos que melhorar”. Essa é uma frase escrita por Chimamanda Ngozi Adichie no livro “Sejamos Todas Feministas”. Como você analisa a participação masculina no movimento feminista?
Mudando os seus padrões constantemente, colocando-se à disposição para ouvir pontos de vista e dando voz, abrindo espaço para diálogo e reconhecendo que o mundo é sim, de uma visão patriarcal, e enxergar que isso é um problema para o progresso da humanidade.
Como tem sido trabalhar o texto do Walcyr Carrasco sobre a direção do Luiz Henrique Rios?
Está sendo incrível! O texto do Walcyr é direto. Não tem rubricas que indicam como devemos falar o texto. O que dá muita liberdade. Eu me sinto livre. O Luiz tem um olhar sensível para todos os atores. E sempre dá ricas indicações, que potencializam a cena em lugares fantásticos. Tem sido uma experiência diária muito enriquecedora, onde me sinto à vontade.
Qual o maior desafio desse trabalho?
Encarar o volume de cenas diário: estudar 20 cenas para o dia seguinte, filmar, voltar para casa e estudar mais 20 para o próximo, conciliar isso com a rotina, os exercícios físicos, a família… Enfim, equilibrar esses tópicos é o maior desafio.
Na trama existe o encantamento de três homens pela mesma mulher. Como você analisa a relação da Aline com eles?
Aline e Caio é aquela relação onde os limites são estabelecidos com muita tensão. Como se fosse um ímã com seu campo magnético, e partes atrativas se repelindo, mas no momento em que as partes atrativas se conectarem, ninguém solta mais. “Eu não quero, mas não consigo”. A relação dos dois habita o campo sexual. Já Aline e Daniel é o amor escrito nas estrelas. O que aconteceu e não avisou que chegaria. Quando viu, já estava ali. Não passa pelo racional. É o coração quem fala. Construído na sinceridade, na verdade e na honestidade. Pureza. E Aline e Jonatas é uma relação que permeia o fraternal, o racional. Aquela relação que você pode contar para tudo, sem esperar nada e está tudo bem. É o aprendizado. A gratidão profunda por quem sempre esteve ao lado, na alegria e na tristeza. Um possível amor, baseado na reconstrução e parceria.
O público tem a oportunidade de ver duas vertentes sua como atriz, a vilã Débora de “Todas as Flores” e a mocinha empoderada Aline de “Terra e Paixão”. Como é ter dois trabalhos divulgados simultaneamente?
Está equilibrado, mas há uma memória mais presente da Débora. A Aline chegou agora na casa das pessoas e está ocupando o lugar da Débora. Mas a repercussão está muito saborosa. Estou muito feliz com todo esse reconhecimento artístico.
Muitos atores comentam sobre as dificuldades que é se manter na profissão, especialmente no começo. Como esse caminho aconteceu com você e em que momento percebeu que poderia viver da arte de interpretar?
O apoio da família é muito importante. E eu tive essa base familiar, que me permitiu investir e cair de cabeça no mundo das artes. Tive a sorte de trabalhar com meus pais no petshop da nossa família, o que me dava liberdade de sair quando eu quisesse para fazer testes e gravar pequenas participações. Quando fiz minha terceira novela consecutiva, percebi que ia dar certo viver da profissão, pois senti que a cada trabalho eu ia consolidando meu nome.
No ‘Fantástico’, você comentou sobre a importância de ter o apoio da família. O talento para arte é herança de algum membro familiar? Aliás, se não fosse atriz, que outra profissão você teria escolhido?
A minha irmã me deu um empurrão, ela fazia aulas na escola de teatro, foi então que comecei a fazer também. Mas antes disso, eu fazia parte de todas as manifestações artísticas no colégio. Acredito que se eu não fosse atriz, seria uma designer de interiores, adoro decoração de casa e tudo ligado a esse mundo.
Na era da tecnologia e da informação, do tudo pra hoje e agora, esquecemos um pouco sobre como aproveitar os momentos com calma. Ficou mais difícil ser feliz hoje por conta desse imediatismo?
Felicidade não é algo que a gente chega, alcança. Felicidade são micro momentos, estados de felicidade. Uma presença. E dá pra ter felicidade muitas vezes no dia. Basta perceber. Acredito também que felicidade não é um estado só de excitação, mas de água mansa. Muitas vezes me deparo com a felicidade, tenho um olhar carinhoso pra essa percepção.
Você acredita em fórmulas de felicidade, em discurso de autoajuda e que a tristeza faz parte de uma vida boa? De que maneira você trata suas neuras?
A fórmula está em se perceber e celebrar. Eu acredito que onde não há dor, você encontra a felicidade. Discurso de autoajuda pode ajudar sim, podem startar percepções que não conseguimos enxergar por nós mesmos. Trato as minhas neuras com leveza, elas fazem parte de quem sou, me forjaram também. Somos luz e sombra. Então abraço minhas neuras.
A arte nos leva a pensar fora da caixinha, nos transporta para outro mudo. Pra quem vive da arte, interpretando, o que você aprende e leva para a sua vida?
Aprendo muito com as minhas personagens. Coragem. A importância de dizer não. Se posicionar quando algo não está legal. O trabalho também me traz muita generosidade e paciência. É um trabalho coletivo. Todos precisamos uns dos outros. Final do set, por mais difícil que seja, quando tem adversidades. Como em todo trabalho, as coisas podem não ir como esperamos. Sempre saio melhor do que entrei.
ENTREVISTA: Ester Jacopetti
FOTOS: Lukas Alencar
BELEZA: Yago Maia
STYLIST: Victor Mazzei