Ela faz parte de um seleto grupo de artistas que busca levar reflexão não só através da arte de interpretar, mas dos personagens que trazem histórias cotidianas e um olhar social sobre o Brasil. Dira Paes tem sua história construída pela luta em busca de uma educação de qualidade para todos os brasileiros. “É a educação que vai trazer a igualdade social. A justiça começa quando todos têm direito à educação de uma maneira potente, rigorosa e responsável. É o mínimo que o Brasil deveria dar aos brasileiros: saúde, educação e moradia”, opina a atriz durante essa entrevista exclusiva à Revista Regional. Do seu último trabalho no cinema, Dira colhe os bons frutos de “Pureza”, personagem que retrata a dura e triste realidade de muitas mães que perdem seus filhos para o trabalho escravo rural praticado ainda nos dias de hoje. “Sem dúvida nenhuma, o papel do artista também é debater, elucidar, fazer reflexões e ampliar discussões sobre temas que são geralmente polêmicos à sociedade, principalmente quando diz respeito à desigualdade social, à fome, às mazelas que são das primeiras necessidades para um ser humano sobreviver”, afirma. Mas seus desafios não param por aí. Na TV aberta, na novela “Pantanal”, que termina nesse mês de outubro, ela interpreta Filó, uma mulher que luta pela igualdade de gênero, reforçando a ideia de um mundo mais justo e mais autêntico.
REVISTA REGIONAL: “Pantanal”, que faz tanto sucesso na TV aberta, termina agora no início de outubro, inclusive as gravações já foram finalizadas. Gostaria que você falasse como foi esse sentimento de despedida, especialmente de fazer parte de um trabalho primoroso como foi essa novela?
DIRA PAES: Já é um ano de envolvimento com “Pantanal” e, sem dúvida nenhuma, foi uma trajetória linda que muito nos orgulha. Todos os envolvidos se sentem extremamente privilegiados de fazerem parte deste coletivo que é a novela. A gente sabe que foi um momento muito especial das nossas vidas, e isso ficou claro na tela, mas, sem dúvida nenhuma, terminar um ciclo como esse dá uma nostalgia porque fomos muito felizes durante todo o processo. Eu acho que esse encontro com o público reafirma tudo isso, e vão ficar as boas lembranças desse momento único nas nossas vidas.
Dira, recentemente você lançou “Pureza”, um filme bastante delicado que retrata a escravidão no Brasil. Onde você encontrou sensibilidade para falar de um tema difícil que relata o sofrimento vivido pela população mais vulnerável do país?
O “Pureza” foi um presente deste roteiro maravilhoso que surge de uma pesquisa profunda sobre o trabalho escravo contemporâneo, e a Pureza é um ícone neste tema, porque ela é uma mulher que existe, está presente nas nossas vidas até hoje, é a primeira mulher a fazer imagens do trabalho escravo contemporâneo rural, e contar a história dela é contar a história de uma heroína brasileira, de uma mãe que não mede esforços para encontrar o seu filho. Nós conhecemos “Purezas brasileiras”. O público está sendo muito receptivo ao filme, todos os dias eu tenho alguém que relata a maneira como viu Pureza e como foi sensibilizado pelo tema, esse é o trabalho do artista que me recompensa profundamente, fazer arte e ao mesmo tempo ter uma função social.
“Pureza” é um filme que fala muito sobre o Brasil atual, você acredita que contar essas histórias ajuda a população a entender melhor o que se passa com o país?
Sem dúvida nenhuma, o papel do artista também é debater, elucidar, fazer reflexões cada vez mais e ampliar discussões sobre temas que são geralmente polêmicos à sociedade, principalmente quando diz respeito à desigualdade social, à fome, às mazelas que são das primeiras necessidades para um ser humano sobreviver. Então, poder fazer um filme que ajuda a elucidar temas que precisam do apoio da população para compreensão dos direitos e deveres como cidadão.
Como ativista de Direitos Humanos, de que maneira a sua luta contra as desigualdades se dá efetivamente?
Minha luta contra a desigualdade social é cotidiana, é uma atividade como escovar os dentes todos os dias, é um pensar de como nós podemos agir para que a gente não contribua de maneira nenhuma a um sistema estabelecido, onde é comum ver a falta de equidades sociais, a falta de possibilidades, a falta de amparo do próprio governo brasileiro em torno da educação. Precisamos fazer com que a nova geração possa estar de igual para igual no mercado de trabalho e que possamos ter novas gerações que não passem pelo que as antigas passaram. É a educação que vai trazer essa igualdade social e a justiça começa quando todos têm direito à educação de uma maneira potente, rigorosa, e responsável. É o mínimo que o Brasil deveria dar aos brasileiros: saúde, educação e moradia.
Dira, são mais de 30 anos de carreira bem-sucedida com muitos trabalhos e projetos envolvidos. Pensando em tudo que realizou, você consegue fazer uma autocrítica sobre o seu trabalho e a importância dele para a cultura brasileira?
Sinceramente eu nunca realizei essa autorreflexão porque ao longo dessas décadas dedicadas à minha carreira de atriz, sempre fico na expectativa de qual será o próximo trabalho, qual será o próximo desafio, para onde a vida vai me levar, essa vida cigana, e de certa maneira tentando dosar com a minha vida de cidadã brasileira, de mãe, tentando um equilíbrio entre essas duas partes, mas, sem dúvida nenhuma, é uma sensação que eu passei por esse Brasil inteiro, fazendo filmes, novelas, teatro. Eu espero que venham outros personagens desafiadores, outros desafios que me coloquem à prova, coloquem a minha inteligência para se reciclar e me reinventar, as emoções que a gente espera são sempre as próximas.
Falando sobre sua estreia como diretora no cinema com o filme “Pasárgada”, de que maneira você analisa mais um passo na sua carreira? Tudo aconteceu conforme o esperado ou você faria algo diferente?
“Pasárgada” surge do momento de reclusão durante a pandemia, um tempo que eu tive ao lado de Pablo Baião, diretor de fotografia do filme, meu marido, e que nós percebemos que estávamos com tempo e desejo de fazer algo juntos, realizar um projeto juntos, e “Pasárgada” foi se desenvolvendo e amadurecendo e se realizou no final de 2020, e agora estamos no processo de finalização de som e imagem, o acabamento do filme, para que ele possa ser inscrito nos festivais, e estamos muito orgulhosos dessa nossa ousadia cinematográfica.
O Festival do Rio 2022, maior evento de cinema da América Latina, que acontece em outubro, reunirá 70 títulos nacionais selecionados. Qual a importância do festival, enquanto cultura, e quais são suas expectativas com a retomada da arte após dois anos de pandemia? Para complementar, você pretende acompanhar os filmes que serão exibidos?
O Festival do Rio vai ser um daqueles reencontros potentes de um dos melhores festivais de cinema do mundo. É, sem dúvida nenhuma, um marco no calendário dos festivais cinematográficos, porque ele está num cenário cinematográfico que é a cidade do Rio de Janeiro, uma capital cultural do Brasil e o festival engrandece o cinema brasileiro justamente com essa potência, dessa seleção, dessa curadoria, que sempre foi uma das melhores que existe no mundo. Estou muito feliz com essa volta. Infelizmente, não poderei estar presente, porque estarei filmando um longa-metragem chamado “Manas”, de Mariana Brennand, em Belém do Pará, logo após o final da novela, mas estarei de coração e muito curiosa para saber como vai ser a repercussão dos filmes durante o festival.
Faltam poucos meses para o final do ano, você já está planejando novos projetos no cinema, televisão ou teatro? Podemos esperar Dira num próximo projeto que a envolva na direção?
Assim que terminar a novela eu embarco no filme “Manas”, que está sendo rodado em Belém do Pará, esse é o meu próximo projeto, quanto aos outros, vamos esperar eles amadurecerem para poder seguir adiante, mas estou muito feliz de estar encerrando este ciclo e depois do filme eu vou tirar férias. Estou precisando (risos).
ENTREVISTA: Ester Jacopetti
FOTOS: Vinícius Mochizuki
BELEZA: Cleide Araújo