- Ituano de nascimento, alma e coração, o empresário José Luiz Gandini estampa a primeira CAPA DIGITAL da Revista Regional;
- Nesta entrevista exclusiva, Gandini revela seus novos empreendimentos para Itu e Salto e faz um balanço do setor automotivo brasileiro
O empresário ituano José Luiz Gandini se tornou mundialmente conhecido à frente da Kia Motors do Brasil. Por cinco mandatos – 1998-2000 / 2006-2008 / 2010-2012 / 2016-2018 e 2018-2020-, foi também presidente da Abeiva (Associação Brasileira das Empresas Importadoras de Veículos Automotores), onde defendeu incondicionalmente a isonomia tarifária e se posicionou contra as barreiras não tarifárias enfrentadas pelo segmento de importação automotiva.
Ituano de nascimento, alma e coração, José Luiz ressalta o quanto a região está crescendo e, principalmente, como faz questão de investir por aqui, especificamente na cidade. O Grupo Gandini intermediou, por exemplo, a vinda de gigantes do segmento supermercadista e atacadista à região como as redes São Vicente e Tenda, que se instalaram em Itu e Salto; e o Pague Menos, em Salto. “Itu é a minha cidade, faço questão de investir aqui. Quero que a cidade siga crescendo e atraindo pessoas e negócios para cá. Faço de tudo para levar o nome de Itu à frente, como, por exemplo, comprar briga com a (TV) Globo quando fazíamos merchandising nas novelas e eu batia o pé que as placas dos carros tinham que ser de Itu. Foi uma briga boa e conseguimos”, recorda em tom de brincadeira.
Outro investimento regional que José Luiz se orgulha muito foi o Gandini Centro Tecnológico, inaugurado em Salto em 2019, e considerado um dos mais modernos laboratórios de emissões veiculares do Brasil, sendo um dos poucos do país capaz de oferecer pacote completo de homologação de veículos, sejam movidos a gasolina, álcool, flex, diesel, GNC, híbridos ou elétricos, com tração 4×2 ou 4×4.
O empresário, considerado um dos maiores empreendedores da região, é quem estampa a primeira CAPA DIGITAL da Revista Regional, com uma entrevista exclusiva. Confira abaixo, na íntegra, a conversa de José Luiz com nossa reportagem. Ele fala um pouco da sua trajetória empresarial, dos desafios e burocracias enfrentadas pelo caminho e os futuros investimentos previstos para Itu e região.
REVISTA REGIONAL: À frente da Kia Motors do Brasil desde 1997, o senhor consolidou a marca no país, além de participar de várias mudanças estratégicas que a Kia realizou no âmbito global ao longo dos anos. Revendo todo o trabalho desenvolvido, o senhor considera ter feito um caminho de mais acertos do que erros?
JOSÉ LUIZ GANDINI: Eu não acho que só acertei nessa trajetória não. Quem apareceu com a marca Kia foi meu pai (José Carlos Gandini), que um dia apareceu em casa com uns catálogos de carros que eu nunca tinha visto na vida, mas que me chamaram a atenção. Com o tempo ele conheceu uma pessoa que estava interessada em procurar um grupo brasileiro para trazer a marca para o Brasil e aí as coisas foram acontecendo naturalmente.
De cara, me chamou atenção a Besta, que inicialmente gerou uma discussão sobre manter ou não o nome, pois aqui no Brasil os significados esbarram em coisas negativas, como demônio, por exemplo. Depois de muito se debater sobre o tema, mantivemos o nome original, afinal era fácil de falar e memorizar. A Besta foi um sucesso, muito vendida no Brasil inteiro, realmente caiu no gosto do brasileiro. A única concorrente direta era a Kombi, que apesar de todo o seu peso comercial no mercado automobilístico, não tinha o conforto e a modernidade da Besta. Nosso público era praticamente o “tio” e a “tia” que faziam transporte escolar.
Mas um dia a Kia mundial resolveu tirar a Besta da linha de produção e colocar outro produto que pudesse atingir um público completamente diferente da Besta. Tiraram a Besta e colocaram o Sorento e, para a gente, foi um impacto muito grande, porque tínhamos uma venda excelente com o antigo carro e estávamos acostumados a lidar com um consumidor mais simples. Nossas lojas e nossos vendedores não estavam adaptados para uma mudança tão grande. Foi bem complicado no início, mas deu tudo certo com muito empenho e dedicação de toda a equipe. Logo depois, a Kia mudou a logomarca e o seu conceito e, de novo, tivemos que nos adaptar. Derrapamos, mas acertamos.
Como foi a entrada do Grupo Gandini no Uruguai com a montadora de lá?
Em 2008 e 2011 fomos o maior distribuidor do mundo. Em 2008 estávamos em uma fase econômica muito boa e a Kia nos deu a oportunidade de fabricarmos um carro, mas para isso precisávamos de uma montadora. Até desenharmos o projeto, colocarmos tudo em prática e tirarmos a ideia do papel demoraria muito tempo. Descobrimos que no Uruguai havia uma montadora pronta, completa, e que estava praticamente parada. Optamos por levar a operação para lá. Aproveitamos as oportunidades, tanto da Kia, como da montadora já pronta, precisando apenas de adaptações para começar a operar. Compramos a operação e começamos a funcionar em 2009 a todo vapor, com a produção do minicaminhão Bongo K2500. Nosso caminhãozinho é um sucesso.
Como está o mercado automotivo hoje?
Tenho fila de espera para alguns carros e muitos comprados que ainda não foram entregues. Apesar de estarmos vivendo uma boa fase no setor, temos um grande desafio que é a falta de algumas peças, principalmente de semicondutores, usados em carros, computadores, celulares, televisões, tablets e uma série de produtos. A China praticamente monopolizou a produção de semicondutores e a indústria não tem recebido o suficiente para finalizar sua produção, independentemente do produto ofertado. Por exemplo, o caso da nossa Carnival, carro de até sete passageiros que já foi lançado o novo modelo na Coreia, mas deve chegar aqui no começo do ano que vem. Estou com o carro pago desde fevereiro, parado, esperando apenas os semicondutores, que, no caso deste modelo, utiliza 68. Quando o carro é menor e menos moderno, usam-se menos semicondutores, mas até para esses modelos menores está faltando o item.
Outro problema, este exclusivamente para o setor automotivo brasileiro, principalmente para nós, que importamos carros, é a carga tributária. Um carro que compramos na Coreia por US$ 10 mil, quando chega ao Brasil pagamos 35% de imposto de importação, mais todos os impostos que a cadeia automotiva paga como 11,6% de PIS/COFINS, IPI, que no caso da Carnival é 25% e mais o ICMS de 12%. A nossa conta é mais ou menos a seguinte US$ 1 lá fora é vendido a R$ 10.
E como faz para concorrer com as montadoras nacionais, uma vez que as importadoras não possuem metade dos incentivos fiscais oferecidos às nacionais?
As indústrias que fabricam carros no Brasil têm benefícios fiscais, federais e estaduais que não permitem que a gente brigue com elas. É muito difícil competir com carro nacional. Eles têm 32% de redução do IPI, não pagam imposto de renda sobre o ICMS, que ainda tem um desconto de 98%. Como vou competir com elas se eu pago tudo cheio e ainda mais os 35% da importação? É muito difícil.
Com a pandemia, tivemos um cenário que ninguém esperava. As vendas caíram sim, algumas concessionárias não aguentaram e fecharam as portas, o dólar bateu altas surpreendentes que impactaram totalmente o nosso mercado. Mas percebemos algo fundamental: o público acostumado com o mercado premium não deixou de comprar. Diariamente vemos carros de marcas famosas na faixa de 17 milhões que não deixaram de ser comprados, afinal esse público investe mesmo e realiza sonhos. Não temos carros dessa faixa na Kia, mas a nova Carnival, que custará em torno de R$ 480 mil, que já é muito dinheiro para o brasileiro, eu sei!, já tem uma fila de mais ou menos 90 carros vendidos, já com o sinal, apenas esperando o carro chegar.
Iniciar a operação no Uruguai teve a ver com a questão tributária brasileira?
Não teve. Teve a ver com a possibilidade que a Kia nos deu de fabricar um carro e ter uma fábrica montada por lá que facilitou todo o processo. Foram oportunidades que pegamos e não deixamos passar.
O senhor pretende expandir a operação da Kia para outros países da América Latina, assim como fez no Uruguai?
Vou ser bem sincero. Pretender não pretendo, mas estou aberto a qualquer tipo de negociação. Como falei, o mercado automobilístico está muito impactado com as faltas de semicondutores e isso é no mundo, não apenas no Brasil. Vai demorar um tempo para o mercado voltar à ativa como antes e, no momento, não vemos negociações como estas, mas se oportunidades aparecerem, com certeza estudaremos as possibilidades.
O senhor acredita que a Reforma Tributária no Brasil sairá um dia?
Tem que sair, por mais complexa que seja, é uma questão de extrema necessidade, tanto para empresários como para consumidores. A tributação no Brasil não é clara. Muitas vezes você paga um imposto porque pesquisou e achou que aquele caracterizava o seu negócio e depois descobre que não era aquele e tem que ser outro. Nesse meio tempo sua empresa é multada porque não está dentro da lei. É preciso uma reforma tributária urgente e que seja feita de uma forma simplificada. Infelizmente há muito interesse por essa questão de tributos e facilitar a vida das empresas sempre fica em último plano.
Como o senhor vê a saída de algumas montadoras automobilísticas do Brasil?
Acho que tem três coisas na saída da Ford do Brasil. Primeiro o carro no Brasil é muito mais caro por conta dos impostos pagos pelas montadoras. Segundo, a concorrência é muito forte e para as marcas sobreviverem sem repassar o custo ela vai ter prejuízo. No caso da Ford ela estava perdendo cerca de R$ 10 mil por carro comercializado no país e isso é muito dinheiro. Terceiro, a questão trabalhista no Brasil também desmotiva e a insegurança jurídica pode ser prejudicial para as empresas.
O que o senhor espera para o último trimestre deste ano, com a expectativa da imunização em alta? Acredita numa melhora na economia?
Em relação à economia brasileira, acho que até melhora alguma coisa este ano. O Brasil vai melhorar aos poucos. Em relação ao mercado automobilístico, eu já falei que vai demorar um pouco mais por conta dos semicondutores, mas isso é mundial e não exclusividade nossa, mas acho que o setor automotivo brasileiro nesse segundo semestre não vai andar e vai repetir mais ou menos o que a gente viu no primeiro semestre. Vou te dar um exemplo, ano passado, quando começou a pandemia, o custo de frete de um container para levar as peças para montar no Uruguai era de US$ 1.800. No começo desse ano chegamos a pagar pelo mesmo frete US$ 10.500. As justificativas eram da alta do dólar, da falta de container, mão de obra escassa por conta do conoravírus e outras variáveis que impactaram o custo. Hoje já normalizou, mas tivemos um momento bem complicado, porque não podíamos repassar esse custo para o carro final na loja.
Tirando o Bongo, na linha de SUV, qual o carro mais comercializado da Kia no Brasil?
Ah, é o Sportage. A propósito, o modelo 2022 está simplesmente maravilhoso. A Kia está investindo ainda mais em alta tecnologia e sofisticação. O novo Sportage já vem com motor híbrido, bem mais moderno para poder despoluir um pouco. Não apenas o Sportage seguirá o conceito do híbrido e elétrico, mas outros modelos da marca também. Antes do Sportage devemos receber o Stonic, que vem com motor híbrido, motor 1.0 turbo T-GDI e deve custar mais ou menos R$ 150 mil. Um carro completo, perfeito.
Outra novidade da Kia será a nova logomarca, que já mudou mundialmente, mas estão fazendo a implantação por continentes. Será preta e prata, no mundo inteiro, e logo deverá chegar por aqui.
Como estão os negócios regionais do grupo? Com a pandemia, muitas pessoas optaram pela tranquilidade e infraestrutura que a região oferece. Cidades como Itu, Indaiatuba e até mesmo Porto Feliz receberam novos moradores e também altos potenciais de consumo. Quais são os novos investimentos que o senhor pretende fazer na região?
Itu foi redescoberta e realmente ganhou muitos moradores com essa pandemia, o que foi ótimo para a cidade. Meu pai falava que um dos maiores visionários de Itu e que contribuiria muito para o seu crescimento era o Jacob Federmann. Idealizar condomínios como ele fez ainda faz a cidade colher muitos frutos. O município desenvolveu uma barbaridade, os terrenos do “Terras 2” (condomínio) aumentaram o seu valor e foram na maioria todos comercializados.
Investir em Itu sempre vai ser prioridade para a gente. Sou de Itu, moro em Itu, amo esta cidade e o que puder para ajudar no seu desenvolvimento farei sempre. O Grupo Gandini foi responsável pela vinda de gigantes do setor supermercadista e atacadista, como São Vicente (em Itu), Pague Menos (em Salto) e Tenda (em Salto e Itu). Ainda neste setor, há o Supermercado Caetano, um projeto de mais de R$ 30 milhões de investimento que está em construção na avenida Octaviano Pereira Mendes (a Marginal), em Itu, na rotatória, onde funcionava o antigo prédio da Volkswagem.
Em Salto, temos o Gandini Centro Tecnológico, inaugurado em 2019, que é um dos mais modernos laboratórios de emissões veiculares do Brasil, sendo um dos poucos do país capaz de oferecer pacote completo de homologação de veículos, sejam movidos a gasolina, álcool, flex, diesel, GNC, híbridos ou elétricos, com tração 4×2 ou 4×4. Para ter uma ideia, estamos funcionando a todo vapor. As marcas têm que testar os carros porque muda a regulamentação de emissão de poluentes e consumo agora em outubro e estamos lotados de trabalho. Ainda para esse ano, no terreno ao lado do Centro Tecnológico – de 14 mil metros quadrados – está prevista a inauguração de um centro de distribuição de uma marca que ainda não podemos anunciar, por uma questão contratual.
Nosso próximo projeto será ali na área do terreno da antiga Mimo, em Itu, que vai do Sesi até o Supermercado São Vicente. Contratamos o arquiteto Roberto Aflalo, responsável pelo projeto do hotel do Terras, para a produção de um master plan para aquele espaço. (dentro da arquitetura, master plan refere-se a um projeto urbanístico que tem caráter físico-espacial, com o objetivo de modelar as transformações que serão geradas num dado espaço). Nossa ideia é fazer algo maravilhoso, com torres residenciais, comerciais, diversos escritórios com a frente voltada para a principal avenida do São Luiz, além de bares e restaurantes que formem uma área de alimentação para ser frequentada pelas pessoas. É um projeto novo, que acontecerá em longo prazo porque é imenso e requer muito investimento, negociação e tempo de construção. Em breve devemos apresentá-lo à Prefeitura de Itu. Quem quiser ganhar dinheiro tem que começar a pensar a investir ali comigo.
entrevista e fotos: ALINE QUEIROZ