Depois de transformar sonho em realidade, o que mais Ana Maria Braga pode querer? De olho no futuro, ela quer mais e tem algumas ideias…
Ela fez parte de uma mudança importante na década de 1990, na relação da mulher com a culinária. Considerada pioneira no assunto, a apresentadora Ana Maria Braga, que carrega anos de experiência na televisão brasileira, desde a extinta TV Tupi, onde produziu e dirigiu o programa de variedades “Agora Boa Tarde” (1974-1980), conversou com a REVISTA REGIONAL e revelou quando o desejo de se dedicar à gastronomia se tornou de fato possível, quando ainda trabalhava na Record em 1993. “Era um desafio, eu tinha um espaço pra fazer uma culinária diferente da que existia, quadradona, que na época quem fazia era a Ofélia (‘Cozinha Maravilhosa da Ofélia’, 1968-1998), que era só naquele formato. Eu achei que poderia tratar de uma maneira mais leve, de um jeito diferente sem aquelas cozinhas tradicionais. Acreditei que poderia dar certo, foi assim que tudo começou”, conta. Seguindo seus instintos, Ana é uma mulher dedicada e de fibra que sempre tomou suas próprias decisões de maneira muito consciente. E hoje prestes a completar 20 anos de “Mais Você” na Rede Globo, ela comentou que fazer o programa com verdade, sempre foi o pilar de seu sucesso. “Eu acredito e gosto muito do que faço, tenho uma produção muito carinhosa, voltada para o momento do povo brasileiro. Nós temos certeza de que temos um produto legal. Vamos entrar e fazer a diferença na casa de alguém. Até que termine o programa, isso aqui pra mim é um santuário. Nós conseguimos fazer com a nossa verdade. É por isso que eu não tenho vergonha de ser meme, de falar errado, não tenho vergonha de ser quem eu sou”, acrescenta. Hoje, com o posto consolidado como uma das apresentadoras mais bem-sucedidas, Ana sempre acreditou em seu potencial. Bateu curiosidade em saber mais sobre ela? Com vocês, a mulher que escreveu sua própria história e venceu não só na vida profissional, mas construiu um império.
REVISTA REGIONAL: Quando você pensa em culinária, qual o primeiro sentimento que lhe vem à cabeça?
ANA MARIA BRAGA: Nós nunca tivemos empregadas, éramos muito simples e o cheiro da comida da minha mãe era sempre muito bom, mas ela não cozinhava tão bem, o cheiro era muito bom, mas o sabor… (risos). Ela não saia do trivial, mas eu sempre tive curiosidade de conhecer outras comidas, e uma das que marcaram a minha época, foi o fogão a lenha. Na minha casa tinha um, mas a minha mãe não usava. Eu tinha esse olhar do interior, por isso, comia muito bem na casa dos vizinhos. Fui crescendo e descobrindo receitas que as minhas vizinhas fazendeiras, amigas da minha mãe, faziam. Eu também tinha uma tia que se casou com um russo, então eu sempre tive curiosidade de aprender uma culinária russa. Ela gostava de cozinhar, inclusive ela cozinhava melhor do que a minha mãe. As duas já morreram, então, nenhuma delas ficará brava comigo, mas a minha mãe sabia disso. A minha tia realmente me ensinou muito. Fui ficando cada vez mais interessada, e quando eu sai de casa com os meus 18 anos de idade, automaticamente tinha que me virar, como todo mundo. Daí surgiu a memória de sabores. Fiquei com essa memória de interior, de comer bem, e acabei caindo nesse caminho o resto da minha vida. Eu morava em pensionato e ninguém sabia cozinhar, quem ia pra cozinha? Eu. Na época quando me mudei para São Paulo pra estudar, comprei uma barraca linda pra acampar, quem cozinhava? Eu. Acabei assumindo essa posição e a partir daí fui aprendendo e me adaptando. Eu fico muito, muito feliz mesmo, porque gosto de chegar em casa e cozinhar. Sempre tenho duas cozinhas nos meus
lugares. Mesmo no meu apartamento, tenho um cantinho onde eu possa preparar uma massa, gosto de fazer pão, de sentir esse cheiro da comida. Cozinhar é um ato de amor, de doação que nós fazemos para o outro. E não precisa saber cozinhar, mas gostar de agradar ao outro. É isso que nós propomos aqui no “Mais Você”.
Recordando um pouco sobre tudo que você passou para chegar até aqui, o que você diria pra Ana Maria daquela época?
Eu morava em São Joaquim da Barra (interior de São Paulo), Deus me livre, eu não sonho em dizer nada pra ela (risos). Não tinha nem televisão naquela época. Eu não tenho nem como conversar com ela, é tudo muito diferente nos dias de hoje. Nós fizemos uma matéria recentemente sobre o que o celular conseguiu substituir. É muita coisa! No meu tempo nem tinha. Imagina na minha idade com sete anos, na minha rua não tinha nem calçamento. Para essas meninas eu teria que dizer coisas bem diferentes porque o mundo mudou bastante e infelizmente nem tudo pro bem. É necessário um olhar além da educação, obviamente que tive a felicidade de ter esse olhar que é muito diferente, tanto na educação como na forma de ver a vida. O mundo mudou bastante.
São muitos anos de televisão e você foi uma das primeiras mulheres a falar sobre culinária, apesar do relato com a gastronomia ainda jovem, o que de fato a motivou ou a inspirou a cozinhar?
Eu gosto de cozinhar, por mais incrível que pareça! Eu tinha um espaço na Record, que pra mim já era um desafio além do artesanato que eu acreditava, eu tinha um espaço para fazer uma culinária diferente da que existia, quadradona, que era o que a Ofélia (“Cozinha Maravilhosa da Ofélia”, 1968-1998) fazia, que era só naquele formato. Eu achei que poderia tratar de uma maneira mais leve, de um jeito diferente sem aquelas cozinhas tradicionais. Acreditei que poderia dar certo, foi assim que tudo começou.
Só no programa “Mais Você” está prestes a completar 20 anos de estrada. Esperava que o programa na Globo fosse dar tão certo?
Claro! Eu tinha certeza, porque eu vinha de uma história de sucesso com a Record. Levantei a emissora em oito anos de trabalho. Eu ficava seis horas no ar, sabia exatamente tudo o que tinha aprendido. Eu sabia a mulher que eu era e tudo que a vida tinha me permitido aprender. Eu tinha certeza de que ia dar certo na Rede Globo. Não tinha nenhuma dúvida. Eu acordo todos os dias às 4h30 da manhã. Quando atravesso aquela porta, não importa o que esteja acontecendo comigo, na minha vida pessoal, eu acredito em Deus, faço a minha oração, tenho uma felicidade danada, porque tenho uma equipe que trabalha todas as manhãs, e todo mundo levanta muito cedo, e poderia estar de mau humor. O meu diretor começa o dia cantando, batendo panelas, os câmeras também, todo mundo grita, assubia, então eu tenho uma dose de energia muito grande aqui dentro todas as manhãs. E termino esquecendo os problemas e todas as preocupações. E como eu acredito e gosto muito do que eu faço, tenho uma produção muito carinhosa, voltada para o momento do povo brasileiro, seja ele qual for ao longo desse tempo porque nós vamos mudando de acordo com o que vai acontecendo a nossa volta. Nós temos certeza de que temos um produto legal. Nós vamos entrar e fazer a diferença na casa de alguém. Até que termine o programa, isso aqui pra mim é um santuário. Nós conseguimos fazer com a nossa verdade. É por isso que eu não tenho vergonha de ser meme, de falar errado, não tenho vergonha de ser quem eu sou. O Louro (José) me ajuda muito, ele é um contraponto, então, às vezes, o que eu não posso falar, ele fala, ou o que eu esqueço, ele lembra. É uma parceria que já dura 25 anos. É uma conjunção de pessoas que se acreditam, gente que é gente e faz acontecer. Eu não faço nada sozinha, mas sem dúvida esse grito de guerra da manhã, me faz chegar mais feliz.
Já que você comentou sobre a questão de ser tornar meme, então realmente não é algo que te incomoda de fato?
Eu replico, é uma delícia! Se você não aprender a rir de si mesmo, não será feliz nunca na vida. Antigamente, muito antigamente mesmo, eu não vou citar nomes, mas bem lá atrás quando não tinha internet e nem nada, quando tinha fofocas e tudo mais, eu era a rainha da fofoca. Foi no começo da minha carreira, e eu estava querendo me firmar, precisava trabalhar como todo mundo, mas me magoava, às vezes. Eu sonhava com aquela maldade, que na maioria das vezes era maldade mesmo. Ou porque eu tinha escolhido um marido mais novo, ou porque eu optei por ir a tal lugar e as pessoas não achavam que eu deveria ir, ou não estava com a roupa certa, enfim, eu ainda me incomodava. O tempo foi passando e eu percebi que não mudava absolutamente nada no meu dia a dia, no dia dos meus amigos e nem das pessoas que gostavam de mim e nem das que sabiam quem eu era. Hoje em dia, imagina, eu morro de rir. Hoje com a velocidade da internet é uma delícia, que bom, vamos rir juntos porque aconteceu e ninguém está inventando nada. O que eu não gosto é da maldade, da mentira. Pra isso já não tem mais caminho.
Quando você fala em fazer um programa com verdade, em relação aos memes, acredita que deixar acontecer naturalmente é uma forma de ganhar o telespectador?
Não é uma questão de errar, mas de ser verdadeira com o que você sente e acredita. Como eu faço parte da produção do programa, não acredito naquele apresentador que tenha um produto como esse, que é um privilégio ter um espaço de uma hora e meia dentro da emissora todos os dias, e você não prestar atenção naquilo que você está fazendo a cada minuto. Eu faço parte da equipe que aprova as matérias, que tem um direcionamento, o que nós estamos buscando, qual o nosso sentindo, o que é o coração do programa, e vamos aprendendo ao longo desses 20 anos. É acreditar no que você faz e saber o que está fazendo. Não é simplesmente chegar aqui todas as manhãs e ler um papel. Requer trabalho, do que simplesmente apresentar um programa.
Em relação à chegada da internet, o programa precisou se readaptar para conseguir continuar com os telespectadores e ganhar novos. Como você se preocupou em relação ao conteúdo para que ele fosse mais dinâmico?
Nós estamos mudando e vai continuar assim, o mundo e a comunicação também, e quem não prestar atenção, porque a linguagem é outra, e se você não souber o que os jovens estão falando, cada expressão que eles usam, não terá condições de ter um portal como eu tenho. Eles assistem ao “Mais Você”, temos uma gama de idade e sexo, e nós temos o homem logo no começo do programa porque ele vem do “Bom Dia Brasil”, e conseguimos manter a audiência com esse telespectador, porque temos conteúdo de matérias que colocamos no primeiro bloco. Os homens que estão em casa tentando sair, também não conseguem porque é um assunto que diz respeito a ele, ou de economia, de algo que está acontecendo no mercado de trabalho, ou possa acrescentar na empresa dele, ou sobre o transporte que ele vai pegar… Depois vamos fazendo uma passagem suave para a dona de casa, para as mulheres e para os jovens, porque se nós não fizermos matéria a respeito das novidades para a internet, se não tivermos um papo que possa ser inserido na vida desses jovens, ele não estará com a gente. O Louro me traz muito isso, o frescor da juventude dos 20 anos e tudo isso faz um bom casamento, mas todo mundo está muito bem antenado o tempo inteiro, e às vezes antecipamos tendência.
Não faz muito tempo você fez um post falando sobre a necessidade de dar uma pausa, mesmo amando o seu trabalho porque gostaria de se dedicar a você e a sua família…
Eu estava de mau humor (risos). Estava trabalhando muito, e devo ter saído daqui e falado “chega gente, tem que ter uma hora que eu preciso pensar em mim”. Mas é natural e esse é o grande segredo, não é todo dia que eu faço esse segredo acontecer. Existem dias que extrapolamos, esquecemos de nós, da família, e a minha fica toda em São Paulo, e eu acho que estava meio nessa fase, que eu não conseguia ver as minhas filhas, os meus netos, não conseguia ir pra minha casa em São Paulo. Eu moro no Rio, mas a minha casa é em São Paulo. Provavelmente por mais feliz que eu esteja, vou estar querendo escrever um texto como aquele. É uma questão de administrar e nem sempre consigo, porque você não pode mudar a vida das outras pessoas em função da sua, por mais amor que você tenha.
De certa forma você é uma mulher à frente do seu tempo, pois sempre batalhou pelo o que acreditava, e hoje é um exemplo de sucesso. Como é ser esse exemplo para as mulheres que se inspiram em você?
É uma honra! A única coisa que eu acho uma pena, é que nós tivemos uma única oportunidade de realmente ter uma mulher no poder, como foi a nossa presidente da República (Dilma Rousseff), com todo o respeito que ela merece, nós perdemos muito. Fiquei muito triste com essa falta de capacidade de dirigir uma nação, que eu achei que qualquer mulher bem preparada, qualquer não, mas bem preparada como eu imaginava que fosse, poderia fazer. Ainda falta muito espaço para a mulher. Cada um constrói o seu caminho.
As pessoas estão acostumadas com a Ana Maria da televisão, mas quando elas te encontram na rua, qual é o sentimento que elas expressam?
É muito divertido. Elas sempre começam a falar sobre algum assunto que eu abordei no programa, e dão continuidade a nossa conversa. São sempre muito carinhosas, tanto os homens como as mulheres. Uma das grandes felicidades que eu tenho no programa, são os depoimentos que nós recebemos, de história de vida mesmo, a respeito de algo que tenha motivado ou ensinado. Com o “acorda menina”, que eu digo todos os dias, a pessoa passa a acreditar. São histórias de pessoas que lá atrás começou um negócio e hoje prosperou, conseguiu comprar uma casa, um carro, viajou pra Europa, realizou um sonho. Nós acreditamos que a cada dia conseguimos motivar alguém, a dar um sorriso, a mudar o caminho na vida para melhor e acreditar nela mesma. É acreditar!
Apesar de gostar de cozinhar você também tem suas secretárias do lar. Diria que é exigente com elas quando o assunto é culinária?
Como dona de casa, eu acredito que nós temos que respeitar o tempo dos outros. Sou uma pessoa que nunca passou a mão em cima de nenhum móvel pra ver se tinha alguma poeira. Cada um sabe pra que está sendo pago. E na primeira vez eu falo que a gente precisa dar uma geral, na segunda explico que a geral não foi feita, e na terceira sou mais direta e falo que a pessoa não está gostando muito do que está fazendo. Eu tenho muita sorte porque gosto de cozinhar, inclusive todas as minhas cozinheiras aprendem comigo, elas têm uma base, mas vamos aprender do ‘beabá’, fritamos um bife, fazemos uma massa de macarrão, coxinha, vamos pra cozinha chinesa, e elas escolhem o caminho delas. Só fica quem quer aprender e elas são ótimas, aprendem! Eu adoro cozinhar para os meus netos, coxinhas, batatas fritas, tudo que tem direito, mas faço um ovinho que é um espetáculo, tudo mundo chega lá em casa: “vovó quero ovinho”. Sou muito coruja.
O que você normalmente faz nos tempos livres?
Eu adoro jogar videogame, tenho todos os equipamentos na minha casa, todos os gadgets de internet que existem eu tenho. Eu conheço um hacker que baixa tudo o que não consigo. É uma coisa que adoro, amo. Não gosto que ninguém mexa (risos).
fotos: Rede Globo