Ator, que foi revelação do remake de ‘Pantanal’, interpreta o lendário Elvis Presley no musical que está em cartaz na capital paulista
Em uma conversa descontraída e exclusiva, Leandro Lima compartilha sua história, marcada por desafios, emoções e muitos aprendizados. De modelo internacional a protagonista no teatro musical, ele revela que a transição para a atuação era um sonho antigo. “Desde pequeno, eu queria atuar”, relembra, refletindo sobre a decisão de se dedicar integralmente à carreira de ator após estudar na prestigiada escola Lee Strasberg, em Nova York. Essa transição, que demandou coragem e foco, é apenas mais um capítulo de sua jornada, agora celebrada com o musical sobre Elvis Presley. Interpretar o rei do rock, segundo ele, foi a preparação mais intensa de sua carreira. Com ensaios puxados e a pressão de dar vida a uma figura tão icônica, ele admite ter se desafiado ao máximo para fazer jus ao papel. O interprete também reflete sobre a magia do teatro em um mundo cada vez mais digital. “Nada se compara a um palco e à emoção de assistir algo ao vivo”, destaca. Para ele, o palco oferece uma pausa da correria tecnológica, um espaço onde o público se desconecta das telas e se entrega ao momento. Quanto aos próximos projetos, Leandro menciona o aguardado lançamento de “A Cerca”, um suspense rural sobre disputas de terra e personagens moralmente complexos. “Nesse filme, ninguém é santo”, brinca o ator, revelando que a produção, gravada em 2020, ainda está em fase final, mas promete surpreender.
REVISTA REGIONAL: Interpretar Elvis no musical (A Musical Revolution) deve ser uma experiência intensa. O que foi mais desafiador na construção do personagem?
LEANDRO LIMA: Foi a preparação mais intensa da minha carreira, com certeza. Foram 64 dias desde o início até a estreia do espetáculo e, por ser meu primeiro musical, eu não estava acostumado com essa dinâmica. É tudo muito acelerado, e ter que cantar, executar a coreografia e ainda dar conta das cenas foi bem intenso. Houve um momento durante os ensaios, acho que na terceira semana, em que meu cérebro começou a dar tilt. Cheguei a sair de casa e fui para um apartamento ficar sozinho, porque precisava ensaiar com a equipe por nove horas e, depois, chegar em casa e ensaiar mais três horas para dar conta de tudo. Precisei me esforçar bastante, pois todo o elenco era muito experiente. Como era meu primeiro musical, minha dedicação precisava ser muito maior.
O espetáculo tem duas sessões aos fins de semana, à tarde e à noite. Como você consegue manter esse ritmo, cuidando da alimentação, do sono e principalmente da voz?
Todo mundo me pergunta sobre essa questão. Sabe, no fim de semana são praticamente duas sessões, com duas horas e meia no palco em cada uma delas. Mas agora o corpo já se acostumou. Ele vai entendendo que aquilo é uma rotina e já ficou bem mais tranquilo, porque nas primeiras duas semanas eu ficava tão cansado que não conseguia nem responder às pessoas. Era um nível de exaustão que eu não me lembrava de ter experimentado antes. Quer dizer, agora me lembro, buscando pela memória, da época em que eu puxava o trio elétrico no Carnaval, quando passava cinco horas seguidas no trio. O cansaço é proporcional a isso. Mas a diferença é que naquela época eu não tinha nenhum cuidado com a voz nem com descanso. Às vezes, nem dava para descansar. Hoje em dia, de quinta a domingo, eu dedico 100% do meu tempo aos cuidados com o espetáculo. Procuro falar menos, faço exercícios de relaxamento vocal, aquecimento e fortalecimento. O mecanismo vocal é um músculo, então ele precisa ser treinado, com exercícios de recuperação, muita água, inalação. E é isso! Tento cuidar da imunidade para não adoecer.
Dentro desse universo do Elvis, o que mais te chamou a atenção na história dele que de alguma forma te tocou?
O Elvis é uma figura conhecida, e eu já sabia muita coisa sobre sua obra. No entanto, conhecia menos sobre o lado humano, sua história pessoal. Um detalhe que eu desconhecia, e que me chamou a atenção — e acredito que muita gente também não sabe —, é que ele era um sucesso global sem nunca ter saído dos EUA. E estamos falando dos anos 1950, uma época muito diferente de hoje, em que a internet propaga tudo muito rápido. Mesmo assim, ele era um sucesso enorme no Japão, no Brasil, vendia muito no mundo inteiro, mas jamais foi a esses lugares. Descobrir isso foi uma surpresa para mim.
Essa é a primeira vez que você trabalha com o Miguel Falabella (diretor)? Como foi esse encontro e o convite para participar do musical?
Sim, é a primeira vez que eu trabalho com o Miguel, e eu confesso que sempre tive essa vontade. Sempre fui muito fã do trabalho dele. E foi um encontro como algo que tinha que acontecer, sabe? Eu estava no Prêmio Bibi Ferreira com um amigo, o Carlos Pazeto, que é amigo do Miguel, e os dois se encontraram. O Pazeto me apresentou, eu estava meio fascinado pela figura do Miguel, fiquei até meio paralisado, e o Pazeto falou: “Cara, seu Elvis está aqui!” E o Miguel disse para mim: “Eu já vi os seus trabalhos no audiovisual, na série e tal, mas você canta como barítono? Baritonão?”. Eu disse que sim, e aí ele me chamou para a audição. Fui, fiz e acabou dando certo. Miguel é um cara ótimo, é um diretor muito assertivo, ele sabe o que quer e é muito criativo. Ativo, rápido e carinhoso com as pessoas. Eu já sabia que ele era um cara legal para trabalhar, mas não imaginava que ele fosse tão carinhoso com o elenco, tão cuidadoso. Está sendo um prazer imenso, realmente.
Em um cenário de entretenimento tão diversificado e fragmentado, qual é o maior desafio ao se conectar com o público? Como você preserva sua autenticidade como artista?
Uma das grandes preocupações ao fazer algo biográfico, especialmente sobre uma figura tão conhecida e presente no imaginário das pessoas, foi manter minha autenticidade e colocar minha marca como ator. Isso foi acontecendo naturalmente, porque nunca tive a intenção de fazer uma imitação do Elvis, mas quis simplesmente colher informações sobre a humanidade dele, que é o que precisa ser retratado. O resto foi deixar a música vibrar e se conectar com as pessoas. A cada dia, cada plateia é diferente, e uma das coisas que eu mais amo fazer é descobrir como criar uma sinergia com o público. E, graças a Deus, isso tem dado certo e sempre é ótimo. As pessoas se levantando no final do espetáculo e curtindo o show é muito prazeroso e tem sido algo natural. Acho que toda a minha trajetória até aqui foi me dando ferramentas para isso. E a conexão acaba sendo natural.
Houve algum papel ou desempenho que transformou a maneira como você enxerga o mundo? Algum personagem que te fez repensar aspectos pessoais ou sua percepção sobre a sociedade?
Uma das coisas mais bonitas do nosso trabalho é estudar um personagem, tentar entender como ele se relaciona com a sociedade. Eu acho que todos eles me trazem alguma reflexão sobre a sociedade. Por exemplo, o Chico, meu personagem em “Coisa Mais Linda” (2019), era um cara super talentoso, um músico que tinha um problema em apresentar sua música da maneira como ele fazia, tinha suas frustrações, o alcoolismo, o machismo e tudo isso me fazia refletir. O Levi, de “Pantanal” (2022), já era um maníaco, praticamente. Um cara rústico que pensava de forma quase animalesca e violenta. Já em “Terra e Paixão” (2023), interpretei um homem que defendia uma mulher de um abuso psicológico. Tudo isso te faz pensar para compor esses papéis. Agora, com o Elvis, eu não paro de pensar na maneira como ele foi manipulado, no porquê isso aconteceu, como um cara tão grandioso, talentoso, acabou daquele jeito. Às vezes, sinto a dor dele, me emociono e me entristeço. E continuo pensando em como o Elvis se relacionava com tudo aquilo que estava acontecendo, em uma época tão nova para ele. Então é isso: todos os personagens me fazem refletir sobre a realidade daquela pessoa e seu envolvimento com o que acontece na sociedade, naquele contexto e tempo.
Sua transição de uma carreira de modelo internacional para ator foi notável. O que te motivou a seguir a atuação e como foi essa mudança para você?
Eu tinha vontade de atuar desde pequeno. Eu fazia peças na escola com seis anos de idade. A vida inteira foi assim. Quando cheguei ao momento de escolher uma faculdade, fui desencorajado a cursar Artes Cênicas. Acabei fazendo Comunicação, Publicidade. A carreira de modelo surgiu na minha vida de uma maneira meio inusitada, que eu não esperava, não procurava, e foi incrível. Inclusive, me deu muitas ferramentas e experiências que muitos dos meus colegas não têm. Ter vivido em tantos países diferentes, aprendido línguas, me relacionado com pessoas que jamais imaginei. Fazer essa transição foi uma decisão minha. Enquanto fazia cursos de ator, continuava “modelando”, morando em um lugar, depois em outro, e as coisas não aconteciam. Foi então que resolvi parar em Nova York e estudar na escola do Lee Strasberg, tipo chegar e realmente mostrar ao universo que era aquilo que eu queria. Juntei um dinheiro, comecei a estudar e me recusava a fazer trabalhos que me tirassem das aulas. Então, foi uma decisão: começar a estudar e me dedicar 100% ao ofício de atuar. Naquele momento, até deixei a música de lado também. Porque se você se dedica a muitas coisas ao mesmo tempo, não consegue ter êxito em nada. Eu acredito nisso, na verdade.
Você trabalhou com Jô Soares em “Gaslight – Uma Relação Tóxica”, sua última direção. Como foi essa experiência e o que mais te marcou ao trabalhar com ele?
Infelizmente, eu não tive contato direto com o Jô Soares. A última coisa que ele fez foi me aprovar no elenco, mas posso dizer que, por fazer o último trabalho dele, guardo isso com muito carinho, por ele escrever esse capítulo na minha história. Quando cheguei, já estava tudo dirigido e, por pouco, não vivemos o processo juntos. Estávamos com um ensaio marcado na casa dele, eu estava super ansioso para ensaiar com o Jô, mas ele se foi. Vou me lembrar desse dia para sempre, e da minha tristeza e frustração por isso acontecer assim. Mas, ao mesmo tempo, fiz o trabalho com muito mais empenho e emoção, por ele. Todo o elenco conhecia muito o Jô, só eu que não. Então, foi um dos trabalhos mais significativos da minha vida, e tenho um carinho muito grande por essa peça e por esse trabalho. Salve Jô Soares!
Com o consumo de arte e cultura cada vez mais digital e imediato, o que você acha que o teatro musical ainda oferece de único ao público em comparação com outras mídias?
Ah, essa pergunta é ótima. A verdade é que nada supera um palco e a emoção de ver algo ao vivo. Eu sou uma pessoa que valoriza muito o que está acontecendo naquele momento, ali na sua frente, sabe? E o teatro entrega isso. Tanto que, mesmo com as pessoas tão conectadas hoje em dia, o tempo inteiro com a cara numa tela, elas têm esse momento de se desconectar. Eu acho necessário resistir a esse movimento tecnológico. E as pessoas estão percebendo isso, porque não só o Elvis tem esgotado ingressos sempre, mas outros colegas meus que estão com peças também estão sempre de casa cheia. Então, as pessoas voltaram a frequentar mais o teatro para ver coisas reais. Frente a frente, sabe? Todo mundo vive num mundo digital, mas é preciso encontrar um equilíbrio. Eu acho que o teatro tem esse papel: ele te mostra um espetáculo acontecendo ali, na sua frente, e te obriga a se desconectar por duas horas do celular. Até em shows, hoje em dia, está complicado, né? Eu fui ver um show do Bruno Mars esses dias. Ninguém dançava, as pessoas ficavam segurando o celular. Até ele pediu: ele falou: ‘Gente, vocês podem desligar o celular um pouquinho e dançar?’
Apesar de você estar dedicado ao musical neste momento, tem o filme “A Cerca”. O que você pode falar sobre esse trabalho?
Filmamos “A Cerca”, acho que em 2020, só que cinema no Brasil às vezes leva muito tempo, né? O filme é um suspense rural, que trata da disputa de terras, e tem algumas coisas obscuras no enredo. Faço um personagem que é um mocinho na história. Quer dizer, na verdade, nesse filme não tem ninguém santo. Foi um trabalho ótimo, mas dá certa frustração de até hoje não ter sido lançado. Não tenho notícias de quando vai sair, mas podem esperar que será uma coisa boa! Ah, e uma coisa muito importante nesse filme foi ter conhecido o Papinha (o diretor Rogério Gomes). Foi lá que ele me convidou para fazer “Pantanal”. Fiz um personagem completamente diferente, apesar de ser do mesmo universo rural.
entrevista: Ester Jacopetti