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História: Pandemia de 1918 teve 2 ondas; Veja como Itu e Salto enfrentaram a gripe espanhola

Enfermeiras usando máscaras, como hoje, carregam macas para atender os infectados pela gripe espanhola, na Europa
  • Historiadores e especialistas retratam o que e como foi a pandemia de gripe espanhola que atingiu o mundo em 1918 e como a região de Itu e Salto enfrentou a doença em duas ondas de contágio

No início do século XX, o mundo foi surpreendido pela gripe espanhola, que agia rapidamente de forma avassaladora. Foram dois momentos da doença, sendo o primeiro em fevereiro de 1918, embora bastante contagiosa, era algo brando, não causando mais do que três dias de febre e mal-estar. Já na segunda onda, em agosto do mesmo ano, tornou-se mortal. No Brasil, a epidemia começou em cidades portuárias como Rio de Janeiro, Salvador e Recife, chegando a São Paulo em 1918.

A origem da epidemia se deu no Estado norte-americano do Kansas e como a imprensa espanhola destacava muito o assunto, acabou rendendo o nome de “gripe espanhola”. A propagação do vírus teve início durante a Primeira Guerra Mundial, quando soldados originalmente do Kansas levaram a doença para a Europa.

No mundo ocorreram cerca de 50 milhões de mortes causadas pela gripe espanhola – mais do que a Primeira Guerra Mundial, que ocorria desde 1914 e contabilizou entre 20 a 40 milhões de vítimas. Apenas no Brasil, estima-se que foram 35 mil mortes.

Jornais locais da época mostram registros da doença na região de Itu e Salto a partir de outubro de 1918, mas os casos começaram a partir de agosto do mesmo ano, fazendo com que os representantes políticos criassem hospitais de isolamento para atenderem os infectados.

De acordo com o historiador Elton Zanoni, em um post publicado no blog Histórias de Salto, na cidade, o total de pessoas internadas no hospital de isolamento improvisado no Grupo Escolar – atual Escola Estadual Tancredo do Amaral – foi de 61, com um número máximo de 26 simultâneos em três desses dias. Houve dois falecimentos: Fernando Tardelli, de 44 anos; e Aurélio Biaggi, de 49 – ambos italianos.

Ainda de acordo com o Histórias de Salto, o primeiro paciente a ser internado no hospital improvisado, em 19 de novembro, foi Eduardo Carlos, de 14 anos, morador no Morro Vermelho e empregado do Sr. Manoel da Silva Ladeira, residente na Vila Nova. A última internada, em 6 de dezembro, foi Julia Ribeiro, jovem de 17 anos, natural de Santa Bárbara e moradora à Rua Paysandu nº 119, atual Rua Ruy Barbosa. Em 8 de abril de 1951 foi assinada a escritura de doação do antigo hospital de isolamento para a construção do asilo.

Registros do jornal A Federação, de Itu, mostram notícias da gripe espanhola em 1918 e toda a movimentação da Santa Casa local nos meses de outubro e novembro. Segundo as matérias jornalísticas, em Itu foram registrados dez casos da doença em outubro e 1150 casos em novembro de 1918. Desse número, 92 faleceram de gripe espanhola na cidade.

Já em Salto, segundo levantamento do coordenador do Museu da Cidade de Salto, Lucas Gonzaga, apenas em agosto de 1918 a epidemia atingiu 500 moradores, dos quais 40 foram vítimas fatais, um deles o doutor Francisco Fernando de Barros Júnior, líder comunitário, empresário e político da época, que não resistiu à contaminação da doença e faleceu em 2 de novembro do mesmo ano.

Como vemos nos dias atuais, com a covid-19, doença causada pelo novo coronavírus, a população não tinha anticorpos para a enfermidade e não havia tratamentos seguros. A medicina buscava tratamentos na ciência, mas por outro lado, a medicina popular sugeria remédios caseiros. Também utilizaram medicamento indicado para a malária, que na época tratava-se do sal de quinino. No início da atual pandemia de covid, a aposta brasileira para o combate do novo coronavírus foi a cloroquina e a hidroxicloroquina, que têm a mesma substância.

A gripe espanhola, assim como a covid-19, foi muito subestimada na época e as coincidências entre as pandemias não param por aí e é como se a história estivesse se repetindo. Os jornais brasileiros, antes de o vírus chegar por aqui, ignoravam ou davam pouco espaço aos relatos. Depois, passaram a cobrar as autoridades por medidas consistentes na área da saúde pública, principalmente sobre os tratamentos realizados sem comprovação de eficácia.

“Aparentemente a pandemia determinou o mesmo comportamento político e social do que está acontecendo agora. Começa com a referência ao fato da gripe espanhola apresentar características benignas em algumas pessoas e agressivas e mortais em outras. Os jornais da época mostravam que a doença gerou um grande alarde sobre a população e cobravam providências inteiras do governo brasileiro”, afirma o médico Ricardo Madeira, responsável por um estudo sobre notícias da gripe espanhola em Itu.

Doutor Ricardo ressalta que um dos questionamentos da população era exatamente sobre a medicação para combater a doença, principalmente sobre o uso do quinino, que era comercializado de forma vantajosa pelas farmácias. “Em 1918 eles já tinham conhecimento dos efeitos colaterais do que hoje seria a cloroquina. As matérias jornalísticas da época afirmavam que o quinino devia ser utilizado durante as refeições para evitar os efeitos colaterais como zumbido nos ouvidos e tremores”, comenta o médico.

Consta no livro “Conselhos ao Povo: Educação contra a Influenza de 1918”, como era a orientação para o consumo do sal de quinino, que mesmo sem comprovação científica, era distribuído à população, com o alerta de que o uso em excesso poderia causar perda de consciência. “…como preventivo, internamente, pode-se usar qualquer sal de quinino nas doses de 0,25 a 0,50 centígramos por dia, devendo usá-los de preferência no momento das refeições para impedir os zumbidos nos ouvidos, os tremores etc..”.

QUARENTENA

Durante a pandemia de 1918, Carlos Chagas assumiu a direção do Instituto Oswaldo Cruz e coordenou as ações sanitárias. Sem respostas seguras para tratamento, coube dotar as cidades de maior número de leitos, fixar regimes de quarentena e isolamento para os navios que aportavam no país e notificações compulsórias de casos da doença.

O Brasil se concentrou em estudos para a criação de uma vacina, que acabaram sendo encerrados sem a descoberta da imunização. O vírus da influenza, que causa a gripe, só foi isolado em 1933. Em 1944 pesquisadores da Universidade de Michigan, nos EUA, desenvolveram a primeira vacina contra a gripe.

 

foto: Everett Collection / Courtesy Everett Collection – stock.adobe.com

 

(Texto: Aline Queiroz)

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