O jornalista e crítico musical Wladimir Soares, dono do épico Bar Pirandello, principal reduto da boemia de esquerda paulistana nos anos 1980, e ex-secretário de Cultura de Indaiatuba, está de volta à cidade
Geralmente em um perfil, o redator conta a história na terceira pessoa, porém nesse, peço licença para dar os meus “pitacos aqui e ali”, isso porque, não conseguiria ser neutra diante de tantas histórias, muitas das quais, são como verdadeiros sonhos para qualquer jornalista. Além disso, a responsabilidade em escrever o perfil de um profissional que já entrevistou Caetano Veloso, Raul Seixas, Paulinho da Viola, Maria Betânia, entre tantos outros, é de dar frio na barriga. Então, me desculpe Wladimir Soares, não conseguirei ser apática.
A entrevista foi em um domingo, três meses depois do jornalista Wladimir Soares ter voltado a Indaiatuba, depois de 11 anos morando e trabalhando em Florianópolis-SC. A primeira impressão, até então guardada para mim, foi de que a casa, relíquia de família, estava intacta havia gerações, porém, mesmo assim, com a cara do atual dono. A sala, repleta de obras de arte e móveis que só de olhar já se sabe que tem histórias, transcorreu cheia de lembranças, encantos e, para essa jornalista, aprendizado.
O bate-papo começou com as histórias dos dois livros que ele escreveu. “O primeiro título foi o ‘Spazio Pirandello – Assim era se lhe parece’, em que narro a história do Bar Pirandello, e o segundo foi um livro agenda comemorativo do centenário de Adoniran Barbosa.”
Ambos períodos reservam grandes histórias. De 1980 a 1990, Wladimir Soares e um sócio foram donos do Pirandello, principal reduto da boemia de esquerda paulistana nos anos 1980. O bar tinha uma banda, cujo padrinho era ninguém menos que Adoniran Barbosa, que anos depois teria sua história contada pelo jornalista. “Em 2009 fui convidado para fazer a biografia do José Possi Neto, irmão da Zizi Possi, para a Imprensa Oficial, mas no meio do trabalho perdi a visão de um olho o que me desestabilizou muito. No começo o José não gostou muito, mas depois ele me escreveu uma carta tão bonita, que me lembro até hoje”, emociona-se.
Mas vamos voltar ao tempo para começar do início! Wladimir fez jornalismo na Cásper Líbero, até hoje uma das melhores faculdades da área do Brasil, e foi nessa época que sua proximidade com o cenário cultural começou. “Fiquei sabendo que estava sendo montada na faculdade a peça ‘Morte e Vida Severina’ e foi nessa oportunidade que comecei como ator. Com a peça fomos para o Rio de Janeiro e, enquanto estava fazendo a divulgação, já que era o assessor do grupo, fiquei sabendo que um dos atores não poderia atuar nas próximas sessões. O engraçado é que esse mesmo ator era o único que tinha uma parte solo na montagem, então eu, com poucas horas de ensaio, assumi o desafio e o teatro veio abaixo”, relembra. Só para constar, a divulgação comentada acima estava sendo feita por Nelson Mota, jornalista, compositor, escritor, roteirista, produtor musical e letrista brasileiro, até hoje reconhecido como um ás no cenário musical do Brasil.
Muitos capítulos compõem a história de Wladimir, todos eles, sempre cheios de parágrafos, vírgulas, aspas, porém nunca um ponto final e claro, sempre com o destino dando uma mãozinha. Mais um exemplo disso foi quando conquistou o emprego dos seus sonhos. Desde o seu ingresso na profissão, o desejo de Wladimir era trabalhar no Jornal da Tarde e o bendito destino, mais uma vez, veio abrir as portas. “Fui passar umas férias em Buenos Aires e lá conheci uma porto-alegrense que me apresentou a outros jornalistas, inclusive um que trabalhava no Jornal da Tarde. Criei coragem, fiz o teste e ingressei na publicação em 1975”, rememora. Nessa época o Maurício Kubrusly era o crítico de música da publicação, quando foi convidado para ser jurado no Festival Internacional da Canção, deixando a vaga para Wladimir. “Dividi com ele a crítica de música, posição que ocupei até 1981, mas que continuei até 1988. Eu era um crítico respeitado tanto que até hoje sou lembrado por essa época”.
A chegada a Indaiatuba
Sabe aquela história do amigo do amigo que apresentou o amor da sua vida? Podemos dizer que foi exatamente isso que aconteceu entre Wladimir e Indaiatuba. Um amigo de um amigo tinha uma chácara na cidade e por isso, desde 1965, o jornalista já visitava o município. Mas o namoro só virou casamento em 1990, quando ele comprou sua própria chácara e mudou de mala e cuia para cá.
Nesse período, Wladimir começou a dirigir espetáculo e foi chamado para trabalhar na Assessoria Especial da Área de Teatros da Secretaria do Estado de São Paulo. “Fiquei indo e vindo da capital por três anos até o dia em que fui convidado para trabalhar na Secretaria de Cultura da cidade”. E aqui vale uma ressalva, pois mais uma vez a porta já estava o esperando aberta. “Uma amiga disse que o prefeito, na época o Flávio Tonin, estava compondo suas pastas e então, em 1993, assumi um departamento dentro da secretaria”, recorda.
Uma das características dos jornalistas é a curiosidade e vontade de mudar, seja por linhas, parágrafos ou ações, no caso do nosso personagem, ele uniu seu conhecimento, seus amigos e sua curiosidade para fazer shows de Chorinho, o Domingo no Parque e a Leitura no Bosque, que ocorria no Casarão Pau Preto e trouxe a Indaiatuba nomes como: Lima Duarte, Paulo Autran, Estênio Garcia, Vera Holtz e Fernanda Montenegro.
Mas não pense que tudo foram e são flores na vida de Wladimir. Algumas pedras, várias até bem grandes, fizeram parte de seu caminho, mas mesmo quando as condições não eram propícias, ele soube fazer arte e transformar seu entorno. E sabe a casa que parece de família? Pois bem… ela é de uma amiga, que estava vazia somente esperando de portas abertas por Wladimir. É ou não é coisa de destino?
texto e fotos: Yara Alvarez