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Post: Sem limites para voar

Sem limites para voar

“Uma vez que você tenha experimentado voar, você andará pela terra com seus olhos voltados para o céu, pois lá você esteve e para lá você desejará voltar”

Advogado não desistiu de voltar ao céu, mesmo depois de um acidente que o deixou paraplégico. Augusto Toledo é piloto de paramotor, modalidade que vem ganhando cada vez mais adeptos na região

“Uma vez que você tenha experimentado voar, você andará pela terra com seus olhos voltados para o céu, pois lá você esteve e para lá você desejará voltar.” Em nome deste sonho, o advogado Augusto Toledo – que desde 1998 reside e trabalha em Indaiatuba – encontrou motivação na frase de Leonardo da Vinci para superar um trauma, bem como as sequelas deixadas pelo episódio. Mesmo com dez anos de prática em vôo livre à época, em 2003, ele foi vítima de um acidente, que o deixou paraplégico.

Por falta de conhecimento técnico, Augusto desprezou o fato de que as condições meteorológicas eram desfavoráveis as manobras que pretendia executar. Várias decisões equivocadas resultaram em uma queda de aproximadamente30 metrosde altura: a partir daquele momento, tinha início uma mudança radical em sua vida. “Na fase mais difícil, um amigo me lembrou que eu teria duas opções: ficar recluso em casa, esperando a morte chegar ou acordar de manhã, sair da cama, tomar um banho e ser feliz. Hoje digo que não há outra possibilidade: mesmo com dificuldades – muitas coisas boas, outras nem tanto – a vida é bela e deve ser aproveitada intensamente”, recorda.

O advogado fez a sua escolha. Paralelamente ao processo de reabilitação, os anos seguintes foram dedicados a um objetivo: reaprender a voar. Seu primeiro desafio foi em âmbito doméstico: vencer a resistência da esposa, Andréa, a quem nosso personagem se mostra grato por ter lhe dado a “força necessária” para encarar essa nova vida. “Ela me apoiou, pois sabe de minha paixão pelo vôo. O resto da família teve que ‘engolir’ minha decisão. Hoje aceitam na boa, já que não houve jeito de eu mudar de ideia”, admite, bem-humorado.

Nesta edição que celebra o Dia dos Pais, Augusto também demonstra o seu carinho por Lucas e Mayara, de 22 e 20 anos, respectivamente. A presença dos filhos foi a mola propulsora nos momentos em que ele estava a ponto de desistir. “Ver aquelas crianças me deu forças para continuar e cumprir com minha obrigação de pai e provedor da família. Eles são o significado de todo o sacrifício que faço. Sinto-me recompensado, pois ambos cresceram e se tornaram maravilhosas, exemplos de seres humanos, fraternos e responsáveis”, conta, orgulhoso.

O recomeço

Com a ajuda do “irmão”, o instrutor Sergio Rosati, nosso entrevistado “começou do zero”: durante a preparação, buscou orientação nos livros, simultaneamente a realização de diversos treinamentos, com aulas teóricas e práticas. Tamanha persistência foi recompensada: em 2008, cinco anos depois do acidente, ele fez questão de voltar ao local onde tudo aconteceu – uma rampa localizadaem São Pedro– para realizar o primeiro vôo.

“A lembrança mais marcante daquele dia foi saber que eu era capaz, mesmo com minha limitação física. Às vezes deixamos de fazer coisas maravilhosas porque ‘achamos’ que não podemos. Há ainda quem diga que não temos potencial, mas a verdade é que nosso limite depende apenas de nós mesmos. Sempre que desejo algo, procuro um especialista na área para saber da possibilidade de fazê-lo”, conta Augusto, que também já praticou outros esportes, como pára-quedismo, canoagem, basquete e tênis em cadeira de rodas, corridas em kart adaptado. No outro extremo, restam alguns itens na sua lista desejos ainda não realizados, como, por exemplo, viagens em locais não muito convencionais e mergulho.

Hoje em dia, Augusto pratica vôo de montanha, e necessita de duas pessoas para auxiliá-lo na decolagem. Para pousar em segurança, o advogado desenvolveu uma técnica que garante uma aterrissagem tranquila. O equipamento utilizado é o paratrike, um parapente cujo motor é fixado num triciclo. À reportagem de Revista Regional, ele revela o que o motivou a lutar por este sonho.

“Não conseguiria descrever a sensação de estar nas alturas, acho que só vivenciando para saber. Já voei dentro das nuvens (entubado), sobre lagos, rios, montanhas, e o que posso dizer que está é uma experiência maravilhosa, pois nos coloca em sintonia com a natureza e o Criador, além de ficar tomado por uma paz sem igual, enfim é espetacular, maravilhoso. Meu ultimo vôo sempre é o mais marcante”.

Bem para alma e o corpo

“Não conseguiria descrever a sensação de estar nas alturas, acho que só vivenciando para saber. Já voei dentro das nuvens (entubado), sobre lagos, rios, montanhas, e o que posso dizer que está é uma experiência maravilhosa, pois nos coloca em sintonia com a natureza e o Criador, além de ficar tomado por uma paz sem igual, enfim é espetacular, maravilhoso”

Além de fazer bem a alma, há ainda outro importante aspecto que deve ser considerado: a prática do esporte ajuda a melhorar a qualidade de vida da pessoa com deficiência. Por essa razão, Augusto faz questão de frisar que a atividade física é essencial para manter uma boa saúde física e mental. “Enquanto estou voando, as dores neuropáticas que sinto simplesmente somem, ao mesmo tempo em que fico mais disposto e zero o estresse da semana em virtude do trabalho”, constata.

Questionado sobre eventuais arrependimentos, o advogado não hesita em assumir que faria tudo de novo, já que, segundo ele, os erros o ensinaram muito mais do que os acertos e foram decisivos para transformá-lo na pessoa que é hoje. O especialista em leis – que se sente tão a vontade quando está nas alturas – filmou todos os seus vôos após o acidente e disponibilizou-os em seu canal no Youtube (veja link no final da reportagem) e agora aguarda a viabilização de um evento previsto para outubro, onde são esperados mais de 50 voadores de paramotor e paratrike, que vão colorir os céus de nossa região. Antes disso, porém, outros vôos serão realizados.

“Todos nós temos alguma limitação ou deficiência, apenas umas mais aparentes que outras. Acredito que estamos nessa vida para aprender e também ensinar algo aos demais. Hoje para o Augusto, o copo sempre está ‘meio cheio’, ele é uma pessoa mais feliz, mais positiva. Devemos valorizar as coisas que realmente importam – família e verdadeiros amigos – e saber que não temos o controle de tudo. As coisas nem sempre acontecem como desejamos, mas, no final, tudo dá certo. A vida sempre vale a pena”. O jornalista que vos escreve, também cadeirante, compartilha deste ponto de vista.

Conheça a modalidade

Embora recente no Brasil, o paramotor – parapente acoplado com um motor – surgiu para atender a necessidade do voador que se encontra longe da montanha. Ao lado do parapente (ou paragliding em inglês), é o esporte aéreo mais lento que existe, proporcionando uma sensação de prazer e segurança aos seus praticantes, que devem frequentar um curso ministrado por um instrutor credenciado e realizado em escola homologada pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) para conseguir a habilitação obrigatória.

Quem nos conta detalhes é o grande responsável pelo retorno de Augusto Toledo ao céu, o instrutor Sergio Rosati, que também é corretor de seguros e possui escritórios em Itu, Salto e Porto Feliz. Com 13 anos de vôo, ele dedica-se, desde 2004, à capacitação de novos pilotos – que começa com vídeos-aula, apostilas e demonstrações “in loco” – durante os finais de semana na Fator Paragliding & Paramotor School, localizadaem Itu. Umavez iniciado o curso, o aprendizado é contínuo, pois o piloto vai se aprimorando e modificando as formas e horários de vôo. “O paramotor requer treinamento e dedicação: em síntese, é preciso que a pessoa esteja habituada à prática de esportes e tenha boa acuidade visual e auditiva”, sentencia.

Depois da teoria, que é bastante extensa, a parte prática se desenvolve conforme o desempenho do candidato. Cumprida esta etapa, o participante passa – ou pelo menos deveria passar a ter – outra prioridade: conhecer a natureza, observando, de maneira especial, as condições meteorológicas. Valendo-se de uma expressão bastante comum na aviação, o vôo só deve ser praticado em “céu de brigadeiro”.

“Pilotos recém-habilitados devem fazê-lo somente ao nascer e pôr-do-sol. Com o passar do tempo, ao se adquirir mais experiência, o vôo pode ser realizado mais próximo ao horário do almoço, quando ‘o sol estará a pino’. Quanto mais quente o solo, maior a quantidade de térmicas e também a instabilidade do ar, o que requer mais técnica”, explica, reiterando a orientação: se as condições forem desfavoráveis, o piloto não deve decolar. “Pior que estar no chão querendo voar, é estar no ar querendo pousar”, alerta.

Sergio salienta que o Brasil, por ser um país tropical, possui todas as características para a prática desse esporte. Nossa região, em especial, por possuir estabilidade durante o ano inteiro. Contudo, segundo ele, é recomendável voar “sempre de olho” nos equipamentos, já que “a área está cercada por aeroportos, o que obriga nos obriga a voar na altura máxima permitida, ou seja, a mesma dos ultraleves que circulam pelos aeroclubes”.

Apesar do ainda elevado custo dos equipamentos – a tendência é que esse valor caia com a popularização do esporte – o grupo pelo qual Sergio é responsável cresce a cada dia. Atualmente são, em média, 15 pilotos. Mas na região já ultrapassam os 30 e no Brasil, por sua vez, há mais de 500 praticantes. Em linhas gerais, pessoas com espírito jovem, que gostam da sensação de liberdade e de viver com a mente tranquila.  A idade mínima é 18 anos e a média, 45, mas, na nesta turma, existe um piloto de 70 anos.

“Na maioria das vezes, quem voa de paramotor é um indivíduo centrado, que já está estabilizado e quer praticar algum esporte que lhe faça bem, recarregue a bateria cansada do estresse do dia-a-dia. Todos os meses existem eventos: alguns oficiais; outros promovidos apenas para um simples encontro de amigos pilotos, que se reúnem para fazer alguma revoada por determinado local, ou um passeio entre uma cidade e outra. Quem pode participa de todos eles, mas, como ocorrem em todo o país, é difícil ir aos mais distantes com frequência. De qualquer forma, encontrar com os amigos é saudável e contribui para deixar mente e corpo em harmonia”, finaliza.

Augusto e o instrutor responsável pela volta do advogado ao esporte

MAIS: para obter outras informações, visite o site da Associação Brasileira de Paramotor (ABPM – www.abpm.esp.br) ou entre em contato com Sergio Rosati, pelo e-mail sergioglider@gmail.com O leitor também pode assistir aos vídeos de Augusto Toledo no Youtube, no canal “Advogado Voador” (www.youtube.com/advogadovoador)

reportagem Piero Vergílio

fotos Arquivo pessoal e Rubem Rocha / Studio Memory

 

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