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Patrimônio ameaçado

Até a década de 40, Itu possuía cerca de 40 casarões no centro histórico, atualmente apenas cinco restaram: antigo Banco Comercial de SP, Museu Republicano, Museu da Energia, Antiquário Dona Lila e Casa da Cultura

Fundada em 1610, Itu completa 401 anos de existência. Sendo umas das cidades mais antigas do Estado de São Paulo, ela possui muitas construções centenárias que nos remetem ao passado e à história desses mais de 400 anos. Casarões, igrejas e ruas antigas fazem parte da memória de todos que aqui cresceram. De todas essas épocas, algo permanece, por menor que seja, e assim novas gerações podem conhecer lugares que fizeram parte da formação da história local e gerações passadas podem andar pelas ruas relembrando seus dias de juventude. Mas será que a contemplação e preocupação com nossas construções históricas é geral ou apenas em pontos isolados?

A cidade conhecida como “Roma Brasileira”, “Cidade dos Exageros”, “Boca do Sertão”, e “Ouro Preto Paulista” está sofrendo com o boom do mercado imobiliário, que gera um crescimento linear e despreocupado, além da falta de informação que faz com que a maioria dos munícipes acredite que preservar o antigo é regredir. “Quando se fala de preservação, é lógico que isso está incluído no desenvolvimento da cidade, porque essa parte antiga histórica e cultural tem que estar em harmonia com os novos projetos de desenvolvimento de Itu. Então, longe de pensar que o progresso de uma cidade não acontece quando se fala de tombamento”, pontua o engenheiro ituano Jair de Oliveira.

O desenvolvimento acelerado e o aquecimento do mercado imobiliário nos últimos dois anos fizeram com que muitas construções no centro histórico fossem desaparecendo e, assim, riscando um capítulo da nossa história. Na década de 40, principalmente, muita coisa virou pó. “O centro histórico, até a década de 40 possuía muitos sobradões, na rua do Carmo, Largo da Matriz, rua Direita [atual Paula Souza], na rua da Palma [atual Andradas] e na rua do Comércio [atual Floriano Peixoto]. Chegamos a ter 40 sobradões, hoje reduzidos a apenas cinco exemplares. É uma grande perda para o patrimônio”, lembra o engenheiro. Os sobrados ainda existentes são o Museu Republicano, Museu da Energia, Casa da Cultura, Antiquário Dona Lila e o prédio da esquina da Floriano Peixoto com a Madre Maria Theodora.

Para que um prédio no centro histórico de Itu possa receber alguma alteração ou até mesmo para ser demolido é necessário que exista aprovação do Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo). Apenas depois dessa liberação é que a Prefeitura de Itu libera um alvará de autorização.

Inventário Condephaat

Em maio de 1989, o Condephaat realizou um levantamento do centro histórico de Itu e criou um inventário de todas as construções que deveriam ser tombadas. Foram mais de 500 edificações inventariadas apenas na zona urbana da cidade, mas poucas são tombadas.

O arquiteto e urbanista Fernando Vicente foi presidente do Conselho Municipal de Defesa do Patrimônio e explica: “Dentro da zona histórica e dentro da zona de predominância histórica, existem edifícios que foram evidenciados pelo seu caráter arquitetônico. Eles foram inventariados. Conserva-se basicamente volume e fachada, mas isso depende de muitas coisas, como presidente do Condephaat, do Iphan, depende da construção em si, acaba sendo um pouco subjetivo. Quando vão sofrer alguma intervenção, esses alvarás serão liberados ou não. Os que não estão inventariados seguem algumas especificações que são do código de obras de zoneamento da zona histórica e de predominância histórica da cidade”.

Até hoje, as edificações realmente tombadas, isoladamente, em Itu, são poucas e são elas: Fábrica de Tecidos São Luiz, Igreja do Senhor Bom Jesus, Museu Republicano Convenção de Itu, Igreja Matriz de Nossa Senhora da Candelária, Pedreiras do Varvito e o centro histórico, que segundo o Condephaat atinge aproximadamente 240 imóveis de diferentes tipologias, construídos a partir do século XVIII.

A questão de patrimônio ainda é um assunto muito delicado, de um lado proprietários que não querem manter a construção e muito menos arcar com restauro, de outro os que são a favor e mantém suas casas. Mas e a população, seja ela proprietária ou não, qual a posição dela? “Em 1970, o Condephaat se voltou às cidades históricas de São Paulo e desde esse momento vem dialogando com a nossa cidade, portanto são 40 anos de conversa. No primeiro momento a população completamente despreparada, completamente indiferente ao seu patrimônio, contanto que muita coisa começa a ser destruída, abandonada, deteriorada, por essa indiferença e falta de consciência da população e dos governantes”, lembra Jair de Oliveira.

A consciência de preservação de patrimônio chegou muito tardia não só em Itu, mas em todo o país. Muita coisa vem sendo mantida de forma responsável e com o intuito de preservar nossa história e fazer com que sejamos perceptíveis a isso ao caminhar pelas ruas. Segundo o arquiteto Marco Benedetti, as construções de maior importância histórica já são conhecidas e cuidadosamente mantidas. “O destaque todo mundo conhece, o que vai se perder e não haverá mais registros são as moradias simples e menores, que são igualmente parte da história e estão sumindo. E quem tem carinho e apreço por elas? O aquecimento do mercado imobiliário é extremamente perigoso para essas construções menores e julgadas sem importância”, ressalta.

O inventário montado pelo Condephaat salvaguardaria muitas dessas construções. “O diferencial de Itu é que uma diversidade arquitetônica existe e se apresenta fortemente. Pelo fato do não congelamento da economia nós temos casas de vários períodos convivendo em harmonia, marcando várias épocas. Por exemplo, na rua dos Andradas há casarões dos anos 70 muito bonitos e que não têm respaldo de uma legislação. Só que se não preservarmos isso hoje, daqui 50 anos não existirão mais”, fala o arquiteto.

Identidade histórica

Sobrado do Museu da Energia

O engenheiro civil André Sotero e a turismóloga Mariele Martin são ituanos e afirmam que o respeito com as construções históricas, como a legislação de placas já seria uma pequena ação que mudaria toda a vista da cidade. “No projeto Cidade Limpa em São Paulo todo mundo foi contra, mas agora todo mundo gosta. A competição comercial é forte, mas não podemos deixar que isso ofusque o patrimônio”, afirma André. Segundo eles, Itu está deixando de aproveitar uma fonte de turismo que seria o turismo arquitetônico, assim como Paraty, Ouro Preto e as “cidades mortas”. “Itu está perdendo o potencial que tem sem explorá-lo e vai acabar”, assegura o engenheiro.

Quem mais perde com o descaso com o patrimônio histórico na cidade são as pessoas menos interessadas. Porque para quem tem o interesse existe a pesquisa onde vão acabar encontrando fotos e registros de prédios agora inexistentes na cidade, mas a pessoa que só passa na rua, acaba absorvendo algo inconscientemente e essa acaba sendo a referência que ela tem de lar, sem sequer perceber. “Isso em algum momento vai fazer diferença, pois é a nossa referência. Por exemplo, as cidades que vão ser inundadas por barragens e as pessoas acabam sendo removidas, já em suas novas cidades entram em depressão porque perdem sua referência e identidade histórica. Então, estamos perdendo a sensação de estar em casa”, acrescenta Mariele.

Dar um uso para as construções tombadas ou apenas inventariadas é o ideal a se fazer, assim ela poderá ser mantida. A área para se preservar é real, mas um incentivo para manter as edificações do centro histórico, não somente as tombadas, deveria existir, pois não basta que as casas existam, mas sim que sejam bem conservadas para a apreciação de turistas e orgulho dos cidadãos.

Valorizar nosso patrimônio arquitetônico é como valorizar a casa em que vivemos, mas mais importante, nossa cidade faz parte, direta ou indiretamente, da nossa formação e deve transcender o gosto pessoal.

PAC – Cidades Históricas para Itu

Prédio do Museu Republicano

Itu foi contemplada pelo governo federal com o PAC – Programa de Aceleração do Crescimento – Cidades Históricas, recebendo recursos financeiros para a preservação de patrimônios e investimentos culturais. O programa foi lançado em outubro de 2009 pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em Ouro Preto (MG).  Implantado no ano passado, o PAC tem como objetivo a revitalização urbana, melhoria da qualidade de vida e fortalecimento da gestão dos municípios atendidos e será aplicado em ações entre os anos de 2010 e 2013. O PAC prevê auxiliar 173 cidades históricas em todo o país. Para aderir ao programa, o município, juntamente com o Estado e o Iphan, precisa elaborar um Plano de Ação que defina um planejamento integrado, coerente com o Sistema Nacional do Patrimônio Cultural e com outras ações. O investimento previsto para Itu é de R$ 17,5 milhões num total de oito ações, entre elas a implantação do “Trem Republicano”, instalação de luminárias a gás e aterramento da fiação elétrica no centro histórico, restauro do casarão que abriga a Casa da Cultura, restauração do Mercado Municipal, execução de obras na Igreja Matriz Nossa Senhora da Candelária e recuperação da originalidade de obras do padre Jesuíno do Monte Carmelo.

reportagem de Gisele Scaravelli

fotos: Acervo Museu Republicano de Itu

 

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